Depressão e atividade física
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Autor: Julio Papeschi
Grupo de Estudos Avançados em Saúde e Exercício - Brasília / DF
Grupo de Estudos Avançados em Saúde e Exercício - Brasília / DF
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a
psicopatologia Depressão é classificada como um transtorno mental, que
se apresenta com humor deprimido, perda de interesse ou prazer,
sentimentos de culpa e fracasso, baixa auto-estima, alterações no sono e
apetite, baixa energia e dificuldade de concentração (WHO, 2011).
Comumente chamada de doença do século ou
doença da vida moderna, a Depressão atinge mais de 121 milhões de
pessoas no mundo, e está associada a 850 mil mortes anuais, o que inclui
um número elevado de suicídios (WHO, 2011). No Brasil os números estão
em concordância com os valores mundiais, o país apresenta
aproximadamente 17 milhões de indíviduos com quadro depressivo. A
incidência da Depressão é duas vezes maior em mulheres, no entanto, não
encontra relação com classe social, etnia e nível educacional (Weissman
et al., 1996; Kendler et al. 2004). Uma previsão da Organização Mundial
de Saúde faz um alerta prevendo que no ano de 2020 a depressão será a
segunda maior causa de incapacidade e perda de qualidade de vidas,
superando patologias como câncer e ficando atrás somente de problemas
cardiovasculares (WHO, 2011).
Estima-se que aproximadamente 25% da
população mundial apresentará alguma crise depressiva em algum momento
da vida. Por seu caráter recorrente, postula-se que 80% dos pacientes
que desenvolvem o quadro de depressão voltarão a ter pelo menos um
segundo quadro durante suas vidas (Anderson IM, 2000) . Estes episódios
tendem a se repetir se não tratados adequadamente e a chance de sucesso
fica menos eficiente a cada episódio, que duram em média 6 meses ou até
mais (Schulberg et al. 1999).
As causas que levam ao desenvolvimento
da depressão ainda não estão bem claras e são alvos de investigação.
Segundo a teoria mais aceita, a depressão estaria ligada a deficiência
do funcionamento ou no déficit na produção de alguns neurotransmissores
ou no funcionamento de alguns neuroreceptores sinápticos, ligados a
áreas do cérebro que promovem sensações de bem estar e prazer. Dentre
eles, se destacam a serotonina, a dopamina e a noradrenalina, no
entanto, alguns outros vem sendo estudados (Manji et al 2001). Estas
teorias se apóiam nos resultados positivos na diminuição dos níveis de
depressão em relação a grupos controles decorrentes do uso dos
medicamentos que promovem elevação no nível destas substâncias. A
eficiência do uso antidepressivos é de 60% a 80% dos casos (Schulberg et
al. 1999). Porém esses resultados não são significativos nos casos de
depressão leve em relação a grupos controle (Depression Guideline Panel ,
1993; Weissman et al., 1996). O que ainda é fonte de pesquisa e de
curiosidade, é que a ação de elevação dos neurotransmissores após os uso
de drogas antidepressivas é de três horas, e diminuição dos sintomas de
três semanas (Anderson IM, 2000)
A hipótese de que a depressão poderia
ter relação com a hereditariedade foi levantada por Warner et al. 1999,
que verificaram que crianças cujos familiares diretos (duas gerações
ascendentes) com históricos de depressão tinham 30% a mais de chances de
desenvolver a doença do que crianças sem histórico de depressão
familiar. Um dado alarmante é que 60% destas crianças desenvolviam a
doença até a adolescência. Outros estudos indicam que os quadros de
Depressão costumam ser de 2 a 3 vezes mais comuns em indivíduos cujos
parentes biológicos em primeiro grau possuíam história de Depressão do
que na população geral (Fleurence et al. 2009 Bierut et a., 1999). No
entanto, o fator ambiental é bem destacado como elemento fundamental
para o desencadeamento da doença. (Berlim et. al, 2001; Kendler et al.
2001; Kendler et al. 2002)
A ciência busca associações também entre
a depressão a questões biológicas/fisiológicas (patologias diversas,
gestação, menopausa, envelhecimento…) e/ou psicossociais (falecimento de
familiares, perda de emprego, separação, nascimento de filho, stress…),
no entanto, tais eventos não podem ser responsabilizados pelo
desenvolvimento e manutenção da doença, pois senão, todas as pessoas que
sofressem com problemas parecidos desenvolveriam a depressão.
O diagnóstico da depressão não é fácil
de ser feito, isto porque não existem parâmetros fisiológicos ou
biológicos que possam determinar de maneira definitiva e conclusiva a
presença da doença. Alguns instrumentos (questionários e escalas)
desenvolvidos por organizações na área da saúde e pesquisadores do
assunto buscam realizar esta tarefa. Dentre eles se destacam, a Escala
de Depressão de Beck (BDI), um questionário de auto avaliação a Escala
de Hamilton para Depressão (HAM-D), que é a escala mais utilizada
mundialmente considerada padrão ouro no diagnóstico de depressão, o
Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-IV) 2 e
a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde (CID-10) 3 , as três últimas escalas aplicadas por
profissionais especialistas (Hamilton, 1960; Beck et al.1961; OMS, 1996;
American Psychiatric Association, 1994).
Para determinação da intensidade do grau
de depressão, da mais fraca a mais severa, e a classificação de suas
diferentes manifestações estes questionários ou escalas devem atingir
critérios específicos em cada uma delas. (Hamilton,1960)
As formas mais comuns de tratamento
estão relacionadas ao uso de medicamentos antidepressivos e a
psicoterapia. Sobre o uso de medicamentos, encontram-se disponíveis
algumas classes de drogas antidepressivas, distintas pela sua ação no
organismo. Atualmente as drogas mais utilizadas no tratamento da
depressão são aquelas que têm como princípio a inibição da recaptação
das monoaminas (serotonina/noradrenalina). (Schulberg et al. 1998;
Schulberg et al. 1999). Embora a eficiência seja comprovada, o custo
elevado e os efeitos adversos do uso continuado, que aparecem com
freqüência, causam mudança de dosagem, tipo de medicamento, estratégia
de tratamento, e também o desmame (redução progressiva na dosagem) após
um período continuado, levando tanto a classe médica quanto os pacientes
a buscarem alternativas ao tratamento por medicamentos (Dupuy et. al.,
2011; Loonen et al. 1991).
Uma forma de tratamento auxiliar que
ganha um espaço cada vez maior no combate a doença é a da prática de
exercícios. “Mens sana in corpore sano”, certamente a proposta do poeta
romano Ulisses, se lida em ordem inversa, encontrará amparo na
literatura científica.
Alguns estudos já encontram relação
inversa entre os níveis de aptidão física e os níveis de depressão
(Lawlor et al. 2001; Salmon et al., 2001; Goodwin, 2003) e que o
engajamento em programas de exercícios traz melhoras nos níveis de
depressão e ansiedade (North et al. 1990; Salmon, 2001). Paffenbager et
al. 1994, realizaram um estudo longo, com duração de 25 anos, e
encontraram correlação inversa entre os níveis de atividade física e os
níveis depressão em um grupo de mais de 10.000 homens.
Excelentes revisões e meta análises
sobre o tema também verificaram a diminuição dos níveis de depressão
através da prática da atividade física regular (North et al. 1990;
Martinsen, 1990; Stich et al. 1998; Dunn et al. 2005; Carek et al.
2011).
Diemo et al. (2001), realizaram um
trabalho no qual apenas trinta minutos de caminhadas durante somente 10
dias foram suficientes para redução significativa dos níveis de
depressão pelas escalas de depressão de Hamilton.
A prática de exercícios em conjunto com o
uso de medicamentos também se mostrou altamente eficiente em diversos
estudos. Blumenthal et al. (2007), dividiram 202 adultos, 153 mulheres e
49 homens em 4 grupos e comparam diferentes intervenções na diminuição
dos níveis de depressão durante 16 semanas. O 1º grupo recebia pílulas
placebos, o 2º grupo iniciou o tratamento recebendo diariamente 50mg de
sertalina, um anti depressivo que age na inibição da recaptação da
serotonina, aumentando a dose até 200 mg até o final do tratamento, o 3º
grupo realizava 30 minutos atividades aeróbias em casa e, por fim, um
4ª grupo realizava 30 minutos atividades aeróbias supervisionadas ambos
entre 70 e 80% da Freqüência cardíaca máxima de reserva. Ao término do
estudo os grupos 2, 3 e 4 apresentaram diferenças significativas para o
grupo 1, no entanto, não apresentaram diferenças significativas entre
si. Um achado interessante do estudo foi o resultado, o resultado
significativo para os grupos que realizaram atividade física sem
diferença entre eles. Isto possivelmente indica que os caminhos que
levam as alterações de diminuição dos níveis de depressão vão além dos
aspectos motivacionais.
Outro estudo interessante buscou a
comparação da prática de exercícios e o uso de medicamento. Durante 16
semanas, 156 sujeitos com idade superior a 50 anos, com diagnóstico de
depressão avaliado pelo DSM IV, HRSD e BDI, foram submetidos a três
intervenções diferenciadas: 30 minutos de atividade aeróbia
supervisionada entre 75% e 85% da freqüência cardíaca máxima três vezes
por semana, 200 mg diários de sertalina ou a combinação dos dois. Ao
final das 16 semanas do estudo todos os grupos obtiveram redução nos
níveis de depressão, sem diferença significativa entre os grupos. No
entanto, quando os indivíduos foram classificados pelo grau de
intensidade da doença, aqueles que apresentavam níveis de depressão mais
severos, conseguiram resultados mais significativos quando participavam
do grupo exercício em relação aos outros grupos. Um outro elemento
importante do estudo é que passadas 30 semanas após o término da
intervenção, o risco de recaída foi significativo somente para o grupo
exercício (Babyak et al. 2000).
Com relação ao tipo de atividade, um
trabalho pioneiro de Martinsen et al. (1989), comparou atividades
aeróbias de intensidade moderada com atividades não aeróbias (força,
flexibilidade, coordenação) durante 8 semanas e não encontrou diferença
significativas entre os grupos.
Exercícios de força e exercícios
aeróbios foram investigados também por Doyne et al. (1987). Neste
trabalho, 40 mulheres foram selecionadas e classificadas após aplicação
do Research Diagnostic Criteria, um questionário para determinação do
quadro de depressão. Posteriormente foram divididas em 3 grupos: corrida
aeróbia, treinamento de força e grupo controle. Os níveis de depressão
foram mensurados pelo Beck Depression Inventory, Lubins Depression
Adjective Check List, e pelo Hamilton Rating Scale for Depression,
durante, e imediatamente após 8 semanas de prática das atividades, e 1, 7
e 12 meses após o estudo. Reduções significativas nos sintomas de
depressão foram encontrados nos grupos que realizaram corrida e
treinamento de força comparados ao grupo controle, contudo, não foram
encontradas diferenças significativas entre os grupos, indicando ambas
atividades podem ser eficientes no tratamento da depressão.
Com relação à intensidade das atividades
Motl et al. (2006), verificaram níveis baixos de depressão em
adolescentes que realizavam atividades recreacionais vigorosas. Algumas
tentativas de dosagens da quantidade de exercício foram propostas Dunn
et al. (2005). Os pesquisadores sugerem que as atividades sejam
realizadas entre 2 e 3 vezes na semana para um gasto de 17,5 kcal/kg
como um formato de prescrição de treinamento para o tratamento da
depressão.
Os mecanismos responsáveis pela
diminuição dos níveis de depressão ou até mesmo a diminuição do risco de
seu desenvolvimento por praticantes de atividade física regular são
desconhecidos. Aumento na produção de noradrenalina, serotonina, melhora
da auto-imagem, maior sociabilização, podem ser alguns caminhos a ser
aprofundados.
Como tratamento auxiliar à psicoterapia e
ao uso de medicamentos, a atividade física já é reconhecida como um
meio importante no tratamento da depressão. Mais pesquisas são
necessárias com metodologias confiáveis, grupos equalizados, presença de
grupo controle, para ser determinada como uma forma efetiva no
tratamento da doença.
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